Recompensas de uma respiração diafragmática

Recompensas de uma respiração diafragmática

O triunfo da paz e o alívio das doenças pulmonares

Tenho uma grande amiga que já não vive neste pacífico país à beira mar plantado. Viajou para granjear uma nova experiência de vida e aterrou num país que já sabia estar em guerra. Quando, na viagem inaugural, foi sentir o ambiente e veio desiludida, alegres pensámos que nunca iria partir. Mas partiu. Sozinha. E já lá vão 28 anos. Continuamos amigas como sempre. Como sabemos, não há longe nem distância, já dizia Richard Bach, e cada vez que lhe conto uma história, um acontecimento das nossas vidas por aqui, os relatos dela são imbatíveis e deixam qualquer um boquiaberto. Se relato que me bateram no carro por trás e fugiram apesar de eu tanto ter chamado, ela conta que por lá o caso é que batem e matam. É tanta a gente e tão pouco o civismo que eles atropelam, fogem e retiram a vida. Se eu digo que o dia a dia aqui é muito agitado, que não temos tempo para parar, trabalhamos horas sem fim, enervamo-nos e a tensão é enorme, ela com toda a doçura refere que todos os dias pensa que vai rebentar, é desta que lhe vai dar o badagaio; começa a trabalhar às 6h00 da manhã e ao mesmo tempo quase a gritar, por muito que tenha ensinado, tudo dado e informado, eles não entendem nem conseguem e ela… endireita, resolve, instrui, decide e perde a voz e a paciência e isto até noite cerrada e a lua já brilhar bem alto no céu. Se eu digo que aqui me roubaram a casa, a ela num assalto por um triz não lhe levaram o filho. Não há hipótese!
No país onde está não há yoga, nem estão para aí virados. A espiritualidade e a consciência física são transmutadas na procura da mais pura das sobrevivências e em hábitos muito menos éticos.
Como não estamos juntas fisicamente, para ela e para qualquer um que queira relaxar e dar valor às coisas simples e acessíveis da vida, relembro e enfatizo a prática de uma boa, ampla e serena respiração. Ao fim e ao cabo tudo aquilo de que verdadeiramente precisamos está ao nosso alcance, nós por vezes é que descuramos.
A consciência respiratória é uma ferramenta totalmente acessível mesmo durante os períodos do dia com maior azáfama e o seu treino permite-nos alcançar não só uma respiração mais equilibrada e relaxante como também um estilo de vida saudável e condizente com esse bem-estar.

Anatomia da respiração

Os pulmões não são músculos, eles expandem e permitem a entrada do ar com a ajuda de três músculos torácicos.
O músculo que efetivamente mais vai expandir os pulmões é o diafragma. Ele tem a forma de uma cúpula ou de um paraquedas e ocupa a posição horizontal no tronco, dividindo-o em duas secções separadas: a cavidade torácica que inclui o coração e os pulmões, e a cavidade abdominal e pélvica na parte inferior do tronco com os órgãos de digestão, assimilação, eliminação e reprodução.
Na inspiração: Quando as fibras musculares do diafragma contraem, arrastam o topo do diafragma para baixo e esta ação faz com que os pulmões expandam com a entrada de ar e os órgãos abdominais sejam massajados ao serem comprimidos.
Na expiração: Quando as fibras musculares do diafragma relaxam, os pulmões encolhem à medida que o ar sai dos pulmões.
Embora toda a respiração seja diafragmática e envolva este músculo, ela é mais ou menos evidente consoante o modo como estamos a respirar. Temos assim:
A respiração superior ou clavicular (uttāma prāṇāyāma) que usa os músculos do pescoço. Acontece na região clavicular, na parte superior do tórax e equivale apenas a 10% do volume de ar inalado numa inspiração profunda. As pessoas que têm doenças pulmonares como, por exemplo, enfisema pulmonar usam este tipo de respiração. É a que exige maior esforço físico e o seu efeito benéfico é reduzido.
A respiração intercostal ou torácica (mādhyama prāṇāyāma) utiliza os músculos da parte superior do tronco, na região média da caixa torácica e equivale a 30% do volume de ar inalado.
A respiração abdominal (adhāma prāṇāyāma) é a que traz mais benefícios a nível físico, mental e emocional e menor pressão no coração. Ocorre espontaneamente durante o sono ou estados meditativos e de relaxamento, permite uma maior absorção de ar com o mínimo de esforço e equivale a 60% do volume total do ar que assimilamos durante uma inspiração profunda. É esta a respiração que mais usa o diafragma.
Apresentam-se de seguida 3 maneiras de fazer esta respiração abdominal e aconselha-se a que pratique durante 7 a 10 minutos (cada uma).

A posição do crocodilo

Esta posição permite sentir a respiração de modo natural e aperceber-se bem das sensações e ter consciência dos movimentos do corpo.
Deitado em decúbito ventral, com o abdómen bem assente no chão, pernas afastadas à largura da bacia com os calcanhares virados para dentro permitindo que a região interna das coxas relaxe no chão. Os braços fletidos à frente servem para apoiar a cabeça e criar algum espaço para que o peito suba.
Vai saber bem observar que a respiração encontrará o seu próprio ritmo sem necessidade de nenhum controlo. Sinta como o abdómen pressiona o chão quando inala e retrocede quando exala. É bom relaxar os músculos abdominais, deixar que os movimentos aprofundem e ir soltando tensões. Ao levar a consciência à zona das costelas inferiores, vai reparar como expandem lateralmente ao inspirar e se retraem ao expirar. A região lombar vai subir com a inspiração e baixar com a expiração; relaxe os músculos das costas e deixe a respiração fluir sem resistência o que vai permitir atenuar alguma tensão na lombar.

Śavāsana ou deitado em decúbito dorsal

Deite-se com as costas e sobretudo a região lombar bem assente no chão, pernas afastadas à largura do quadril e braços descontraídos ao lado do tronco com as palmas das mãos para cima, os olhos fechados e o queixo alinhado com o esterno. É uma postura de total relaxamento e abandono. Por incrível que pareça é para muitos das posições mais difíceis de manter; o facto é que todos sabemos acelerar durante o dia e lidar com milhentos pensamentos, mas alguns não sabem deixar de controlar, abandonar-se simplesmente e apreciar uma boa paragem de movimentos e o relaxamento.
Com a inspiração é fácil e bom observar que o abdómen sobe e que baixa ao expirar. Se pousar suavemente as mãos na barriga permitindo que os dedos médios se toquem, verá que se afastam com a inspiração e voltam a unir-se com a expiração.
Ao respirar lenta e suavemente, vai reparar que o movimento das costelas é quase inexistente e a tranquilidade aumenta.

Sentado e aproveitando para apenas respirar

Sente-se numa cadeira com as mãos apoiadas nas coxas, feche os olhos e observe o que acontece com a sua respiração.
Nesta postura há um suave afastamento das costelas para os lados e uma menor expansão do abdómen comparativamente com o que se consegue em śavāsana.
Simplesmente observe o fluxo respiratório sereno e a calma que a sua mente vai obtendo, sobretudo com uma expiração muito lenta e suave.
Poderá colocar a mão direita no abdómen imediatamente acima do umbigo e a mão esquerda no peito e tomar consciência de como ele sobe com a inspiração e baixa ao expirar.

Benefícios:

A respiração diafragmática é particularmente aconselhada para quem sofre de doenças pulmonares obstrutivas crónicas. Recomendada em casos de bronquite crónica, enfisema pulmonar e asma. Aliás são bons todos os tipos de prāṇāyāmas (exercícios de controlo e expansão da respiração) inclusive com retenção da respiração;

  • É uma ferramenta inata ao seu alcance que proporciona equilíbrio, conforto e descontração;
  • O nível da tensão interna diária diminui;
  • Acalma o sistema nervoso através da libertação de endorfinas na corrente sanguínea;
  • Diminui a ansiedade;
  • Treina o foco;
  • O movimento do diafragma massaja os órgãos abdominais e tonifica os músculos da parede abdominal, melhorando assim as funções digestiva, metabólica e excretora;
  • Melhora a circulação sanguínea no fígado, baço, estômago e pâncreas e consequentemente as suas funções;
  • Ajuda a drenar o sistema linfático subdiafragmático;
  • Melhora o desempenho e eficiência cardíacos;
  • Relaxa as tensões mentais;
  • Previne doenças do foro psicossomático, incluindo episódios de pânico.

Como tal, quando a ansiedade ou os medos do dia a dia pareçam esmagadores, sabemos que temos um amigo interno que nos conforta a mente. Além disso, à medida que melhoramos a qualidade da respiração, melhoramos implicitamente a qualidade da nossa vida.

Texto escrito por Cristina Diniz